Cada vez mais universidades oferecem bolsas de mérito aos candidatos com melhores médias de acesso. O que fizeram esses alunos para conseguir tão boas notas, e como é que podes chegar lá durante este ano letivo? Fomos falar com alguns deles, pedimos a opinião a um especialista, e contamos-te tudo aqui.
Olhas para o estudo como uma obrigação e só te agarras aos livros quando já não há mais saída? Então tens um problema de motivação que precisas de resolver. Tentámos perceber como, numa conversa com Pedro Rosário, investigador da Escola de Psicologia da Universidade do Minho, e trazemos-te dicas que podem fazer toda a diferença na tua vida académica.
Estudar é um martírio? Tens um problema de motivação!
Há quem diga que a escola não se modernizou e não soube acompanhar a evolução dos tempos, ou que os métodos de transmitir conhecimento não favorecem a tua aprendizagem, ou até que na sala de aula não são utilizadas as mesmas ferramentas que usas no teu dia a dia. Tudo isso é válido mas explica apenas uma parte do problema.
A questão fundamental, segundo o especialista Pedro Rosário, tem a ver “com o gozo, com o domínio”. Os problemas de motivação vêm do domínio da informação, e o aluno “está mais disponível para investir numa determinada área se se sentir confiante no seu domínio em relação a ela”, assegura.
No estudo, encontras habitualmente vários desafios: a concentração no estudo – para a qual há muitos fatores distratores, como a televisão, as séries, a internet, os amigos, etc. – e isso implica que saibas ter o controlo da sua vontade e empenho na realização da tarefa.
Depois, de acordo com o Dr. Pedro Rosário, há um outro desafio muito superior: “o facto dos alunos não terem bagagem suficiente em determinada matéria, ou saberem que têm dificuldades a ler, ou a escrever, ou a resolver problemas, o que dificulta ainda mais o estudo”. Tudo junto, e o ato de estudar torna-se um desafio gigantesco…
Resumindo, a natureza do problema vem da tua motivação e da forma como enfrentas a tarefa. E muitos alunos fazem-no de forma deprimida e sem grandes objetivos…
“Objetivos concretos, realistas e avaliáveis”
O que é que eu quero ser? O que quero alcançar? Que notas preciso de ter? Estas são as perguntas que te deves colocar, antes de qualquer outra coisa. A partir daí, és tu quem deve construir o seu rumo. Como? Definindo objetivos claros e usando as ferramentas certas.
“Do que vale quereres emagrecer 3 quilos, se depois não praticas desporto nem fazes uma alimentação saudável? O mesmo vale para o estudo.”
A reflexão é do especialista Pedro Rosário, e diz muito da força de vontade que precisas de ter para evoluíres como aluno. E dá-te um exemplo sobre como deves pensar:
1 – Procura metas concretas e alcançáveis – Querer ter boas notas é um desejo, mas o que é ter boas notas? Se costumas ter 3 a tudo, ter alguns 4 no final do período podem ser boas notas… O mesmo já não é válido para quem tenha sempre 4 a tudo. Por isso, dizeres que queres ter boas notas não é um objetivo claramente avaliável;
2 – Define um calendário de estudo (de 30 minutos por dia, por exemplo) – Este é um objetivo concreto, que também é realista e avaliável;
3 – Identifica quais são os teus recursos – isto é, a tua realidade até agora (notas, hábitos de estudo, capacidades, etc.) – os teus objetivos atuais e a tua força de vontade, até chegares onde queres.
NOTA: É importante teres a noção clara de que a tua força de vontade terá de ser tanto maior quanto mais lacunas de aprendizagem tiveres, porque o esforço que terás de fazer para alcançares o teu objetivo também será maior.
Como ser um “guerreiro do estudo”
Afinal, como é que podes passar da teoria à prática? O Dr. Pedro Rosário resume tudo numa expressão: “Precisas de ser um verdadeiro ‘guerreiro do estudo’!” Como? Nada como um profissional da Psicologia da Educação para te ajudar:
1 – Tenta descobrir os teus limites
A expressão “guerreiro” não surge por acaso. Para melhorares o teu desempenho escolar e chegares a um nível elevado, tens de ter, realmente, “a disposição de um guerreiro”, conforme te explica o nosso especialista. “Tens de querer verdadeiramente conquistar alguma coisa, e estar disposto a agir e a lutar por isso. Tens de querer descobrir os teus limites e tentar ultrapassá-los. Porque se tanto te fizer ter média de 12, de 14 ou de 18 valores, este discurso não cola…”
2 – Valoriza o papel do estudo
Tens de ser tu a valorizar o trabalho e o investimento que tens de fazer no estudo. Se te for igual ao litro, se ir para a escola for uma tarefa mecânica, e se não a encarares como uma verdadeira profissão, não conseguirás evoluir como aluno.
O Dr. Pedro Rosário vai mais longe: “A escola é o teu trabalho, e ter um trabalho não é necessariamente mau, pelo contrário! É uma oportunidade de contribuíres para a sociedade. É aqui que vais aprender muito do que precisas para a tua vida adulta, e se não for agora, quando terminares a escolaridade obrigatória, terás de decidir de continuas a estudar ou se vais trabalhar… Será que vais estar equipado para isso? Será que a sociedade poderá confiar em ti?”
Porque mais importante que a nota propriamente dita, é a tua preparação para entrares na universidade, e mais tarde para seres um bom profissional.
3 – Autorregula a tua aprendizagem
Os alunos que alcançaram o “objetivo: propina zero” são pessoas capazes de “autorregular a sua aprendizagem”, conforme te elucida Pedro Rosário. Significa isto que “estabeleceram um objetivo muito claro – entrar para a Universidade, num determinado curso, e lutaram por isso, independentemente dos desafios que surgiram”.
São jovens que, tal como tu, também têm amigos e outros aliciantes que os podem desviar, mas que foram capazes de “fazer um esforço para controlar o seu comportamento na direção dos seus objetivos. E depois disso, ainda fazem a monitorização dos seus resultados, de forma a afinar as suas estratégias”, reforça o nosso especialista.
Os alunos que têm sucesso “vivem a escola como uma academia”, de acordo com Pedro Rosário, e por isso “não lhes passa pela cabeça ir para uma aula sem se prepararem para ela”. E quando têm dúvidas, olham para elas “como uma oportunidade de aprender com os professores e os colegas – são pessoas proativas e procuram melhorar”, em vez de reagirem ao que lhes vai acontecendo, conclui.
4 – Trabalha para a excelência
Procurar ser o melhor não é o mesmo que apontar imediatamente para a nota 20. Conforme refere o Dr. Pedro Rosário, “os objetivos têm de ser ajustados à realidade de cada um e o processo de melhoria de nota deve ser um processo gradual. Se tenho média de 14 valores, talvez não deva colocar desde já o meu objetivo numa média de 17… Passar pela média de 15, e depois pela média de 16 é uma ideia melhor. Ter objetivos desajustados não ajudam ninguém, e estabelecer metas demasiado altas legitimam, muitas vezes, a falta de resultados.”
Qualquer aluno que queira melhorar as suas notas deve, por isso, começar por algo fundamental: procurar ajuda junto de pessoas que saibam ensinar aquilo que quer aprender – professores, pais, amigos, ou quem achares mais indicado. Expores as tuas dificuldades às pessoas certas é uma mais-valia, que te pode levar a colmatares as tuas lacunas e a avançares no teu objetivo.
Os alunos com propina zero
Juliana Salvadorinho, aluna de Engenharia e Gestão Industrial na Universidade de Aveiro
Ganhou uma Bolsa de Mérito com média de 19,2 valores
Ao contrário do que se diz por aí, não são necessários livros de autoajuda ou “receitas” que te ensinam a ser “O Bom Aluno”. É bastante simples na realidade: basta ser-se alguém persistente, ou melhor, muito persistente, que pergunte muito, porque só os idiotas é que acham que quem pergunta muito não sabe nada.
Depois, sem qualquer dúvida, ter o apoio dos pais, porque muitos dos princípios que fazem parte de nós provêm deles, e esqueçam aquela conversa de que só quem tem pais doutores é que é bom! O meu pai ficou-se pelo 9º ano e a minha mãe pelo 10º, e não é por aí que não me incutiram que tenho de estudar e tentar sempre o meu melhor para ser alguém na vida. Trata-se de ver o óbvio e lutar pelos próprios objetivos.
Eu não fiz nada para ganhar uma bolsa, foi simplesmente uma consequência de 12 anos de trabalho. Um dos grandes erros que os alunos cometem é estudar de forma árdua apenas no secundário; com isso, esquecem-se que, para terem sucesso, é preciso ter-se já adquirido um método de estudo ao longo dos anos. Não existe um método único que seja fiel a todas as pessoas, e cada um sabe a capacidade que tem em se concentrar, o tempo necessário de descanso, a forma como prefere fazer os próprios resumos, e tudo isso requer tempo e experimentação. Daí que muitas vezes existam bons alunos do 3º ciclo, que quando passam para o Ensino Secundário se veem com “onzes” e “dozes” nos testes.
Para conseguir esta bolsa, dei sem dúvida o meu melhor, e para isso tive de estudar muito, mas não é nada que não me tenha permitido fazer outras coisas. É possível ser-se bom aluno sem entrar no estereótipo de que quem tem boas médias só faz aquilo e aquilo mesmo, basta ser-se organizado e querer muito.
Como dicas, diria que o importante é conhecermo-nos verdadeiramente e seguir aquilo que nos faz feliz. Mas não se fiquem só pelo seguir, sejam os melhores! E se aquilo que vos fizer felizes for entrar na universidade com uma bolsa de estudo, então fixem bem essa meta e trabalhem para a alcançar! Pensem em grande, por favor – deixem de pensar pequeno – sejam persistentes, procurem fazer sempre o vosso melhor e não caiam no erro de desistir à mínima dificuldade. Sejam curiosos, e mais importante do que tudo, estabeleçam prioridades.
Durmo sempre oito a nove horas por dia, e não nego que estudo muito, mas foi sempre um estudo contínuo e não apenas na época de exames. No entanto, as pessoas nascem com aptidões diferentes e nem todos podemos ser bons alunos na escola, caso contrário não existiam bons alunos. Sejam bons alunos para além disso!
O que eu fiz foi persistir sempre e, com a ajuda dos meus professores consegui obter os resultados desejados. Sozinha não consegui nada. Foi sempre trabalho de equipa.
A Juliana estudou Ciências e Tecnologias na Escola Secundária Dr. Mário Sacramento, terminou com média de 19,3 e candidatou-se à Universidade de Aveiro com média de 19,2.
Leonor Mendes, aluna de Música na Universidade de Aveiro
Ganhou uma Bolsa de Mérito com média de 18,9 valores
Para chegarmos à “propina zero”, é necessária uma grande disciplina e a adoção de bons métodos de estudo. Claro que isto significa que tem de haver algum sacrifício por parte do aluno, talvez no que toca à sua vida familiar e social. É preciso que sejamos pessoas muito focadas e determinadas.
Para além disso, também é importante que exista um ambiente favorável à obtenção de um nível de excelência: não só a qualidade de trabalho e a capacidade do aluno, mas também o nível do ensino que é proporcionado pelos professores e pela própria escola.
Nunca estudei com o propósito de obter a bolsa de mérito, até porque apenas tive conhecimento da sua existência após ingressar na universidade. Mas claro que o meu nível de esforço e de estudo foi bastante elevado, porque sempre me propus a alcançar os melhores resultados, e sabia que poderiam ser decisivos na hora de me candidatar ao Ensino Superior.
Para isso, estudei regularmente ao longo do ano letivo, aumentando a intensidade do estudo nas épocas de testes e exames. Felizmente, não achei nenhuma das disciplinas especialmente problemática, e todas as dificuldades com que me deparei ao longo dos anos resolvi-as através do estudo, ou mesmo pedindo ajuda aos professores.
Para mim, o segredo foi trabalhar com empenho, dedicação e afinco, e principalmente não hesitar em procurar ajuda junto dos professores, se necessário. Algo que me ajudou bastante a manter-me determinada e focada no meu trabalho foi o desejo de atingir em cada ano os melhores resultados que conseguisse, tendo sempre em mente que estes seriam pequenos objetivos que levariam ao meu grande objetivo final: Ingressar no curso e na universidade da minha preferência.
A Leonor estudou Música na Escola Secundária do Fundão, terminou com média de 18,6 e candidatou-se à Universidade de Aveiro com média de 18,9, com o exame específico de Inglês, no qual obteve 20 valores.
Ana Rita Fernandes, ex-aluna de Turismo e Gestão Hoteleira na Universidade Europeia
Ganhou uma Bolsa de Mérito no final da licenciatura, com média de 15 valores
Na minha opinião, é preciso começar logo desde o início do ano a acompanhar a matéria e as aulas, e a tirar apontamentos. É importante também pesquisar e perceber bem os cursos que queremos e as universidades que os têm. E assim, ficamos com a noção da média que precisamos de alcançar.
Durante os 4 anos de licenciatura, fui aperfeiçoando o meu método de estudo. Cheguei à conclusão de que se estivesse atenta nas aulas, tirasse apontamentos e resolvesse os exercícios propostos pelos professores, depois para os testes teria apenas de rever as minhas notas para complementar com os materiais de estudo fornecidos pelos professores.
Ao longo desse tempo, as disciplinas mais problemáticas foram, regra geral, as que estão relacionadas com cálculo. Economia, gestão financeira, estatística, porque são áreas que requerem estudo sistemático e não uns dias antes dos testes. Ao longo do tempo fui-me apercebendo melhor disso, e assim comecei a esforçar-me mais para estudar de forma regular ao longo do semestre, em vez de deixar tudo para a última.
Passados estes 4 anos de dupla licenciatura, acabei os dois cursos (Turismo e Gestão Hoteleira) com uma média superior a 15 valores.
Assim, consegui a bolsa de mérito para o mestrado, que vou fazer no próximo ano letivo, em Gestão de Recursos Humanos.
A Ana Rita completou uma dupla licenciatura em Turismo e Gestão Hoteleira na Universidade Europeia, terminou com média de 15 valores e candidatou-se ao mestrado em Gestão de Recursos Humanos, para o qual ganhou uma Bolsa de Mérito.
[Reportagem: Tiago Belim]
[Fotos: cedidas pelas entrevistadas]